No More Takes: A Dúvida

sábado, 22 de janeiro de 2011

A Dúvida


A Dúvida de S. Tomé, claustro inferior do Mosteiro de Santo Domingo de Silos, Burgos, 1085-1100
A figura no canto inferior esquerdo está a viver um momento marcante. Tomé, um empirista resoluto, toca naquele que morreu e sete dias mais tarde regressou à terra. Ver para crer é a máxima que norteia a sua aquisição de conhecimento.
Cristo, a figura alta e central dessa representação, ao dar-se a ver parece corroborar a posição epistemológica do discípulo. Mas com o seu aparecimento, o ressuscitado quer transmitir outra ideia: a fé não se alimenta de evidências. Felizes aqueles que crêem sem ter visto, lê-se algures no Evangelho de S. Mateus.
Nos séculos XI e XII a leitura não era uma actividade generalizada entre as populações. Assim, coube às representações dos Evangelhos uma manifesta função doutrinal. Os teólogos chamaram a si a escolha dos temas dos programas iconográficos que deviam representar uma teofonia, ou seja, a revelação de Deus. Os ensinamentos da Bíblia, lidos por uma minoria monástica, foram transpostos para imagens simbolicamente organizadas no espaço. Segundo Gombrich em The Story of Art, o claro predomínio da representação de ideias em relação à imitação da natureza permitiu ao artista

dispensar qualquer ilusão de espaço ou de acção dramática, ele podia arranjar as suas figuras e formas segundo linhas puramente ornamentais. A pintura estava, na verdade, no caminho de se tornar uma forma de escrita em quadros; mas este retorno aos métodos mais simplificados de representação deu ao artista da Idade Média uma nova liberdade para experimentar modos mais complexos de composição (composição = reunir ou juntar). Sem estes métodos, os ensinamentos da Igreja não poderiam nunca ter sido traduzidos em formas visíveis. (...) Foi esta libertação da necessidade de imitar o mundo natural que lhes permitiu comunicar a ideia do sobrenatural.
Não há imagens neutras, mesmo quando a sua natureza é conceptual.

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