No More Takes: O 13º membro

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O 13º membro


Quem nunca ouviu uma tirada como: "És mesmo um carneiro típico! Teimoso!" ou a mais conclusiva: "Ele nunca me enganou. Os gémeos têm duas faces!"? Mas se calhar o típico carneiro é afinal um nativo de peixes, enquanto que o gémeos com dupla face não passa de um touro com maior ou menor tendência para a raiva. Quem o sugere é Parke Kunkle, um astrónomo norte-americano que deu recentemente uma entrevista à NBC a defender uma alteração do zodíaco com a introdução de um décimo terceiro signo: o Serpentário (Ophiuchus). Segundo Kunkle, oscilações no eixo da Terra provocadas pela força gravitacional da Lua criaram um salto de um mês no alinhamento das estrelas. Estas lentas alterações operadas ao longo dos milénios, obrigam a rever as versões do calendário feitas antes da era cristã por astrónomos Babilónios.

Confusões entre astrólogos e astrónomos à parte, há uma questão mais terrena que se impõe: como se sente uma pessoa que sempre acreditou que era capricórnio e que afinal é sagitário? Vai partir a caneca com a imagem do seu signo que lhe ofereceram há uns anos atrás pelo seu aniversário? Ou seja, o que é que as pessoas que acreditam num conjunto de traços definidores da sua personalidade vão fazer com esta nova informação discrepante?

Para nos ajudar a responder a estas questões, entra em cena Leon Festinger. Este psicólogo social é autor da teoria da dissonância cognitiva. A sua teoria motivacional dá conta de um processo recorrente nos humanos: a auto-justificação. A maioria de nós sente que as suas convicções devem estar em consonância com o seu comportamento. Se acredito que o tabaco é prejudicial para a saúde, por exemplo, é provável que não fume. E se descobrirem que sou fumador? Porque este comportamento é inconsistente com a minha atitude sobre o tabaco, sentir-me-ia motivado a justifica-lo. A dissonância cognitiva é esse estado de tensão fisiológico que sucede sempre que um indivíduo tem duas ideias, atitudes ou opiniões psicologicamente inconsistentes. Como a coisa não é agradável, o que temos de fazer é reduzir esse estado. Mas como? Das duas uma: ou alteramos cognições de modo a harmonizá-las, ou adicionamos cognições que estabeleçam relações com as cognições originais. Peguemos nos signos. A Rita descobre que afinal não é capricórnio, mas sim sagitário. Toda a vida acreditou que era persistente, metódica e trabalhadora. Bolas! Na verdade, é intelectual, honesta e sincera. Há aqui uma inconsistência. A forma mais fácil de resolvê-la é aceitar a mudança (ou por na prateleira o horóscopo). No entanto, a Rita acredita que a sua identidade foi moldada pelo primeiro signo. Passa então ao contra-ataque: "de certeza que aquele astrónomo está a delirar! Há imensos exemplos na minha vida que comprovam que sou capricónio! Até a minha mãe o diz!". Pode igualmente argumentar que como os efeitos da mudança do eixo da terra são negligenciáveis para influenciar significativamente o alinhamento com o sol, a introdução de um novo signo é um exagero. Há aqui dois factores que são importantes: as crenças sobre a identidade individual são algo de inestimável e a teoria da dissonância cognitiva retrata as pessoas como seres peritos em racionalização. A Rita continuará a beber o café da manhã empunhando a sua caneca predilecta.

2 comentários:

  1. É isso ai!!!

    Nota teórica: É mais fácil mudar atitudes que comportamentos, pelo que o fumador que disse fumar mata, mais facilmente dirá "nunca disse que fumar matava" que "vou deixar de fumar" ou "nunca fumei"... Isto para dizer que a nossa memória é uma maior defensora do nosso bem estar do que as célebres "memórias traumáticas" ou "fantasmas do passado" possam sugerir!

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  2. A memória não é aleatória, muito menos quanto mete o self ao barulho.. Obrigado pelas dicas sobre a dissonância.

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