No More Takes: História com imagens

domingo, 16 de janeiro de 2011

História com imagens

Adão e Eva após o Pecado Original, portas em Bronze da Catedral de Hildesheim, Bispo Bernward c. 1015
Por estes dias, tenho andado de volta do livro de E. H. Gombrich, The Story of Art (Phaidon Press, 1995). Em vez de soterrar o leitor com um corropio de datas, épocas, cânones, Gombrich guia-nos magistralmente pelas salas do museu que construiu ao longo da sua carreira de historiador. A sua erudição e a clareza, tornam a leitura da obra obrigatória para quem se interroga sobre a experiência artística e não saiba muito bem por onde começar. Por todo o livro perpassa um elemento orientador: que para melhor apreendermos as obras de arte, as devemos conceptualizar como criações humanas localizadas no espaço e no tempo. Com isto quero dizer que as soluções a que os artistas chegaram para harmonizar as partes num todo, não são apenas fruto das suas competências técnicas e imaginativas, mas também das crenças partilhadas do seu tempo. Numa tentativa de clarificar os elementos definidores de um estilo ou de uma época, o austríaco naturalizado inglês, estabelece paralelos entre obras, contrasta ideias de diferentes povos sobre a finalidade da arte, enfim, legenda esta primordial tendência humana para representar o mundo.

Mas porque fui buscar a imagem de Adão e Eva? Há primeira vista, o conjunto não parece muito gracioso. As quatro personagens, destacadas sobre um fundo tosco, são retratadas de forma rígida. Conclusão: isto não nos encanta. É precisamente aqui, que Gombrich vem em nosso auxílio com uma pista crucial para um novo entendimento da obra:

"Lembremo-nos do ensinamento de S. Gregório, o Grande, segundo o qual "a pintura é para analfabetos aquilo que os livros são para os que sabem ler." 

Agora tudo faz mais sentido. Esqueçamos a desproporção e a fealdade das figuras. Os nossos critérios não são importantes neste momento. O que realmente importa é concentrar a atenção naquilo que Deus fez a Adão e Eva após o Pecado Original. Se lermos o painel da esquerda para a direita, da mesma maneira que um crente o faria na igreja de Hildesheim na Alemanha há mil anos atrás, conseguimos acompanhar, a par e passo, a estória bíblica: Deus aponta para Adão, este para Eva, que por último, culpa a serpente. A origem do pecado é-nos relatada com uma clareza impressionante - sem qualquer palavra escrita tivemos acesso a um episódio marcante do Génesis.

Sem comentários:

Enviar um comentário